sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Heróis da liberdade

Dica de Eduardo Carvalho.
Lindo texto de Luiz Antônio Simas, que eu aconselho ler antes de ouvir a música.

Liberdade, Senhor! O samba de mil anos.

É impressionante a quantidade de fatos que ocorreram em 1969 e estão sendo, quarenta anos depois, constantemente lembrados pela imprensa. É verdade que o ano em questão foi da pá virada - aconteceu mesmo de tudo.

O Concorde foi criado; a lua deixou de ser dos namorados e São Jorge se empirulitou com a chegada da Apollo 11; o festival de Woodstock inaugurou a suruba no lamaçal; o doido do Charles Manson matou a Sharon Tate; o Jornal Nacional entrou no ar; o embaixador dos EUA foi sequestrado pela rapaziada do MR-8 e da ALN; o presidente Costa e Silva vestiu a farda de madeira; Médici chegou ao planalto; apagaram o Marighella; o Fluminense papou o campeonato carioca; as feras do Saldanha se classificaram para a Copa de 1970.

Aconteceram mais coisas impactantes, mas não me ocorrem agora e eu estou sem paciência para descobrir pesquisando nos googles da vida. Também não acho relevante dizer que, com um ano de idade, comecei a falar umas coisas desconexas e tentei - segundo fidedigno relato da senhora minha mãe - o suicídio me atirando do berço.

No meio dessa profusão de efemérides, porém, estou convencido do seguinte: Em 2969, na comemoração dos mil anos da data, só dois eventos serão lembrados mundialmente - 1969 foi o ano do milésimo gol de Pelé e do samba Heróis da Liberdade, hino maior do GRES Império Serrano, da parceria Silas de Oliveira, Mano Décio da Viola e Manoel Ferreira.

Para prosseguir na minha tarefa de matar os imperianos do coração, coloquei na rede a monumental gravação AO VIVO do Heróis da Liberdade. Isso mesmo - o Império Serrano entoando, em 1969, logo depois do lançamento do nefasto AI-5, o brado maior em defesa da liberdade; uma verdadeira declaração dos direitos fundamentais do homem em forma de epopéia.

Heróis da Liberdade é uma daquelas obras de arte que - feito o Quixote, a Nona Sinfonia, a Pietá, a cerâmica marajoara, as máscaras de Ifé e a Mona Lisa - permanecerá enquanto a humanidade permanecer. Patrimônio do espírito do homem em sua dimensão mais elevada, é simplesmente isso que temos que reconhecer nesse samba - ouvindo em silêncio reverente e mostrando aos nosso filhos e netos, para que eles cantem, um dia, aos que virão. E sintam, quem sabe, orgulho de sua condição de homens humanos feito os seus avós.

Façam o teste para cardíacos: Ouçam a Serrinha cantando.

Abraços




Heróis da liberdade
(Mano Décio da Viola, Silas de Oliveira e Manoel Ferreira)

Passava noite, vinha dia
O sangue do negro corria
Dia a dia
De lamento em lamento
De agonia em agonia
Ele pedia o fim da tirania
Lá em Vila Rica
Junto ao largo da Bica
Local da opressão
A fiel maçonaria, com sabedoria
Deu sua decisão
Com flores e alegria
Veio a abolição
A independência Laureando
O seu brasão
Ao longe soldados e tambores
Alunos e professores
Acompanhados de clarim
Cantavam assim

Já raiou a liberdade
A liberdade já raiou
Essa brisa que a juventude afaga
Essa chama
Que o ódio não apaga pelo universo
É a evolução em sua legítima razão

Samba! Oh, samba!
Tem a sua primazia
Em gozar de felicidade
Samba, meu samba
Presta esta homenagem
Aos heróis da liberdade

Ô, ô, ô, ô
Ô, ô, ô, ô
Ô, ô, ô, ô
Liberdade, senhor!

Um comentário:

Willian Tadeu disse...

Esse samba é inigualável. Está tão acima de qualquer média que outros belíssimos sambas do mesmo ano - destaco o da Imperatriz, que pra mim é um dos melhores da escola junto com 1970 e 1980 - acabaram caindo praticamente no esquecimento. Silas é gênio, dificilmente teremos outro semelhante.